sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

#8 Jamais te deixes filiar



“Jamais te deixes filiar”, disse um dia Nietszche.

Nos meus já longos 20 anos de PSD, essa frase volta e meia atormenta-me e ecoa-me como reflexão que se impera obrigatória, para mais num livre pensador como eu, considerado mesmo um excêntrico em alguns aspectos, em contraposição com a habitual “carneirada carreirista” com a qual volta e meia tenho convivido.

Conheci vários líderes ao PSD. Ajudei a eleger alguns, mesmo.

Fui a todos os congressos desde essa altura, desempenhei vários cargos nacionais. Era mesmo conselheiro nacional até este último congresso, em que decidi não integrar nenhuma lista candidata e declinar os habituais e “sedutores” convites.

Conheci o PSD de Cavaco Silva que desprezava a máquina e o aparelho. O PSD pouco entusiasta de Fernando Nogueira. O PSD dos “dois terços mais um” de Marcelo e das diatribes com Portas. O PSD de Barroso de olhos postos na Europa. O PSD vanguardista de Santana com uma armadilha feita ao próprio. O PSD de Marques Mendes e os seus falsos moralismos. O PSD conservador de Manuela Ferreira Leite que excluiu Passos Coelho da lista de deputados. O PSD do nortenho Luis Filipe Menezes, que desistiu ao fim de pouco tempo. Enfim, o PSD de Passos Coelho.

Alguns destes líderes, eleitos mesmo com o meu entusiasta apoio. Claro que o balanço só se faz depois.

Em todos, vi serem aprovadas moções por mim apresentadas que depois em nada foram cumpridas. Aliás, durante muitos anos gastei muito do meu tempo, pensando Portugal e o meu concelho, para apresentar propostas em sede própria.

Sempre aprovei o que pensava, por vezes por unanimidade. E depois? E depois: NADA.

Em todos os congressos, li atentamente conteúdos programáticos de encher o olho, mas pouco estruturantes e a definirem um caminho perceptível, cá fora. Mas se até assim é nos programas eleitorais colocados a sufrágio ao povo, de que vale a pena espantar-me?

Ouvia eu atentamente António Costa, Presidente da Câmara Municipal de Lisboa e candidato não assumido a Secretário Geral do Partido Socialista, que a par de Pacheco Pereira e Lobo Xavier, dissertavam sobre o congresso do PSD.

Dizia Pacheco Pereira que "não se desfiliava, porque ainda não entendia esgotada a possibilidade da social democracia regressar ainda ao PSD", porque a entendia viva, num país que em vários casos como no Porto, em Sintra, ou em Oeiras, havia optado por caminhos independentes.

Ou seja, no seu ponto de vista, tratavam-se de social democratas convictos, que recusando lógicas internas do seu partido de sempre, optaram por caminhos social democratas estrategicamente apelidados de “independentes”.

António Costa por sua vez, dizia que “a social democracia está viva no Partido Socialista” e de que quem se rever nessa linha ideológica, tem lá o seu espaço.

Eu vou sem dúvida mais longe que qualquer um deles. Porque a democracia está é podre.

As direcções dos partidos, com maior ênfase nos do arco do poder, baralham-se e desmultiplicam-se em afirmações que desdizem logo de seguida.

Conheço muitíssimo bem o PSD. Mas conheço bastante bem o PS, o CDS e o PCP.

Não raras vezes, nestas duas décadas, dialoguei com amigos meus, seus dirigentes locais, distritais e nacionais. As histórias são as mesmas, com outras caras apenas e a cobro de “ideologias diferentes”.

O BE não o consigo levar a sério, pese embora por vezes a generosidade de algumas boas ideias. Todavia, quando penso na possibilidade de algum dia chegar ao poder, assusto-me ainda mais.

Dos outros partidos não falo sequer, distantes que ainda se encontram de se afirmarem na sociedade portuguesa. Com, ou sem razão.

E neste quadro, a frase de Nietzsche ecoa com força: “Jamais te deixes filiar”.

Do associativismo apartidário, cheguei eu ainda miúdo, à filiação posterior num partido. Serei dos poucos que leu a sua história, que interpretou a sua ideologia e que se identificou com ela. Conheci homens e mulheres de elevada craveira ética e intelectual. Outros... bom... outros menos.

Mas de pouco nos servem as palavras se não se transformarem em actos no dia a dia, num discurso de verdade.

Olho à esquerda e à direita de Passos Coelho e já não há homens providenciais. Já não há líderes carismáticos como foram nas suas épocas: Sá Carneiro, Mário Soares, Freitas do Amaral e Álvaro Cunhal.

Vivemos outros tempos, é certo. E se muito do que o PSD de hoje tem feito é estritamente necessário, à luz de erros graves que vêm de governos anteriores, verdade também é, que muito do que este governo tem feito, não tem tido a minha concordância.

E agora, Nietzsche? E tu, Portugal?



* Artigo original de opinião, por mim publicado hoje em:
http://www.oeirasdigital.pt

4 comentários:

  1. Concordo em absoluto com a tua reflexão o que nem é caso para admirar.
    Quis o destino que tendo mais uns aninhos que tu já conte com 39 anos de JSD/PSD pelo que definitivamente me acho demasiado velho para algum dia deixar o partido que fez parte de grande parte da minha vida.
    Salvo se um dia, que admito que infelizmente já pode ter estado mais longe,o partido vier a ser liderado por alguém (lider e equipa) que me faça ter absoluta vergonha de ser sequer conotado com eles.
    Acho que hoje o PSD vive o problema que os outros partidos vivem não só em Portugal como na Europa democrática (é...continua a haver para lá dos Urais uma Europa não dmocrática) que é o de verem os quadros mais bem preparadas fugurem da actividade politica como o diabo da cruz. Não só porque nas suas vidas profissionais são bem melhor remunerados mas também porque fazer politica é hoje uma actividade mal vista e muito desprestigiada. Pelo que vão ficando os ...outros. Os que não tem profissão, os que na profissão nao tem sucesso ou temsucesso relativo, ou aqueles que veêm na gestão da "res publica" a maneira mais rápida de aumentarem a fortuna privada.
    Estamos a falar, como é evidente, de muitos dos que frequentam o topo das hierarquias partidárias.
    Onde, e apesar de tudo, ainda existe gente dedicada ao serviço público de forma transparente e honesta.
    Entre os quais, pese embora os erros graves e as teimosias penosas (de que a nova CPN é apenas um triste exemplo),considero estar Passos Coelho.
    O resto quae todo é que...adiante.
    Por isso , e para concluir, caro Armando acho que apesar de tudo o PSD ainda tem futuro.
    Não o futuro segundo Pacheco Pereira (safa,safa...) mas um futuro assente nos muitos e muitos militantes generosos, dedicados, honestos e servidores da causa publica (no poder local nomeadamente) e que nas secções e distritais (mais nas primeiras do que nas segundas em boa verdade) mantém vivo o velho PPD/PSD herdado de Sá Carneiro. Como é que esses militantes poderão regenerar o partido isso é outra história e que ficará para outro comentário um destes dias.

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    1. Meu grande amigo Luis... ler-te é sem dúvida um bálsamo para a angústia que vivo, no que a esta matéria diz respeito. Felizmente que a minha vida é bem mais do que isso. Sempre foi.

      Mas lamento que tantas horas e décadas despendidas (muitas vezes contigo) ao serviço de verdadeiras causas e com a "marca" PSD, não tenham servido para hoje poder olhar e reconhecer este partido como indiscutivelmente o meu.

      Ou não fui forte o suficiente para nele inscrever a minha marca, ou outros foram mais fortes a destrui-la.

      Espero que tenhas razão e que o PSD tenha futuro (bom) e por conseguinte Portugal. Confesso-me no entanto, pouco crente. Um abraço, aparece sempre.

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  2. Durante a nossa vida, há decisões que tomamos e que mais tarde acabamos por nos arrepender, e outras que, com o passar do tempo constatamos terem sido grandes decisões nalguns casos dignas de um visionário. Ter-me desfiliado do PSD há mais de 10 anos foi sem dúvida das melhores decisões que já tomei. E jamais deiarei filiar-me. Um grande abraço!

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    1. Bem me lembro :) na vida, devemos ser sempre leais aos nossos princípios, quaisquer que eles sejam. Mais importante que não mentirmos aos outros, é não mentirmos a nós mesmos. Abraço.

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